*Hamilton Bonat
Já publiquei dois livros de crônicas e colaborei na elaboração de outros quatro, estes de cunho histórico. Falarei apenas dos primeiros, pois deles couberam-me todos os riscos. Quem já se aventurou, como eu, e não é uma celebridade, também como eu, sabe das dificuldades. A primeira é arcar com os custos, antes mesmo de a obra ficar pronta. Ao assinar o contrato com a editora, adianta-se a metade do valor devido. A segunda parcela tem que ser honrada ao se receber os exemplares encomendados. A partir daí, é se virar para vendê-los, contando para isso com parentes e amigos fiéis que, além de adquirirem a obra, divulgam-na aos seus conhecidos.
Trabalho nada fácil este, o de mercador de um produto que não representa uma necessidade básica, como são os alimentos, por exemplo. Se levarmos em conta que estamos no Brasil, aí então a tarefa transforma-se num desafio para Hércules. E dá-lhe fazer lançamento em diversos locais, arcando com coquetel, aluguel de espaço, confecção de convite, correio e outros mais. E dá-lhe proferir palestra para, durante os intervalos, divulgar e oferecer o livro, na esperança de que alguém se interesse, o que, normalmente, acontece.
Acrescente-se a desleal (neste caso, mera figura de linguagem) concorrência de escritores famosos e de celebridades de todo tipo. Para terem uma ideia, meu segundo livro encontra-se disponível numa grande rede de livrarias de Curitiba, que estabeleceu o preço de R$ 28,00. Nas mesmas lojas, ele disputa com obras de Paulo Coelho, oferecidas por R$ 19,00. Qual deles você compraria?
Além do mais, quem lança um livro quase que se vê obrigado a fazer algumas cortesias, ofertando-o graciosamente a certas pessoas e instituições. Cá entre nós e a enorme torcida brasileira, sempre tive a sensação de que essa gentileza representa um tiro n´água, pois são exemplares que, via de regra, não serão lidos. Quem paga, normalmente lê, nem que seja para saber se o investimento valeu à pena. Quem é presenteado não dá valor.
Sempre defendi essa tese, mas por mera intuição. Agora está comprovado. Dias atrás, ao assumir o cargo, um prefeito recém-eleito deparou-se, em seu novo gabinete, com uma estante repleta de obras, com dedicatória aos seus dois antecessores. Tudo leva a crer que elas não foram sequer folheadas. A falta de tempo pode justificar. Porém, nada justifica o fato de os seus proprietários não terem tido, sequer, a preocupação de levá-las consigo. Afinal, eram suas. O novo prefeito mandou entregá-las aos donos. Espero que não tenha sido, apenas, com a intenção de liberar a estante para nela colocar as cortesias que, imagina, receberá a partir de agora.
Desconheço os autores, mas avalio suas dificuldades, o tempo e o dinheiro que investiram (a não ser que tenham conseguido algum patrocínio público ou privado), e, por que não, o orgulho que sentem daqueles “filhos”, como todo autor considera seus livros, piores que sejam.
Devo confessar que não doei nenhum dos meus “filhos” a prefeito algum. Claro que o fiz a algumas bibliotecas e a instituições sérias. Mas, prometo, se voltar a me aventurar no campo literário, cobrarei de todos, nem que seja um simbólico R$ 1,99, como alerta de que, por traz de todo produto, está o esforço de várias pessoas, que devem ser reconhecidas e valorizadas. A exceção ficará por conta da minha mulher, filhos e netos, na condição de aceitarem, no prazo de um mês, serem sabatinados, numa prova do tipo “ENEM do vovô”.
Mas, que é difícil competir com os Paulos Coelhos da vida, ah, como é! Se tivessem consciência disso, os ex-prefeitos teriam levado seus livros para casa. Nem que fosse pela esperança de um dos autores vir a tornar-se um novo Machado de Assis. Portanto, se você está pensando em se aventurar, vá em frente. Faça um “filho”, mas não o doe. Venda-o sempre. Só assim você será lido e não ficará mofando numa estante qualquer.
Fonte: www.bonat.com.br