Iguaçu: foz, “falls” e papas

*Hamilton Bonat

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No século XVII, o governo espanhol confiou à Companhia de Jesus a tarefa de transformar as aldeias indígenas em reduções. Assim, os jesuítas espalharam-nas pelo Paraguai, Argentina e sul do Brasil. Mais tarde, após demoradas negociações, as fronteiras entre os três países foram definidas, separando aqueles núcleos religiosos, o que viria a ser uma das causas de sangrenta guerra, a da Tríplice Aliança.

Por isso, quando o Tenente José Joaquim Firmino chegou com sua expedição a Foz do Iguaçu (1889) para fazer valer os direitos do Brasil, encontrou muitos paraguaios e argentinos. Brasileiros eram poucos. A Colônia Militar, criada pouco antes, marcaria o início da ocupação efetiva do lugar. O “IBGE” da época identificou uma população de 324 pessoas que viviam em treze casas e alguns ranchos.

A partir de então, outros nacionais sentiram-se encorajados a chegar. No início do século XX, a população já somava 2.000 pessoas, brasileiros em sua maioria. O vilarejo dispunha de uma hospedaria, quatro mercearias, um rústico quartel, estação telegráfica e engenhos de açúcar e cachaça.

Em 1912, o Ministério da Guerra, encerrada a sua missão, entregou o povoamento ao governo do Paraná. Em 1914, foi criado o município de Vila Iguaçu, mais tarde Foz do Iguaçu. Ele chegaria ao ano de 1970 com apenas 33.970 habitantes. A construção da Usina Hidrelétrica de Itaipu, então iniciada, causou forte impacto em toda a região. O contingente populacional passaria a ser de 136 mil pessoas em 1980. Hoje é de cerca de 260 mil.

Fazia muito tempo que Rafael não ia lá. Ficou admirado. A região havia evoluído e se transformado num polo turístico de primeiro mundo. Parece que Itaipu fez com que os iguaçuenses descobrissem sua própria grandeza e decidissem revelar ao mundo as belezas da sua cidade.

No final da visita às cataratas, já no ônibus, a palavra que Rafael mais ouviu, em vários idiomas, foi “extraordinário” e suas derivações: “magnífico, estupendo, deslumbrante”. Cá entre nós, não há como ficar insensível após percorrer o quilômetro e meio da trilha que nos conduz a poucos metros das quedas. O indescritível impacto causado pelas águas ao se lançarem de uma altura de 80 metros aumenta na medida em que a trilha se aproxima da garganta do diabo, onde se encontram as mais altas das 275 quedas. O som ensurdecedor e a força da natureza faz com que todos, sejam católicos, evangélicos, umbandistas, judeus, muçulmanos, ateus e à-toas, tenham consciência da sua pequenez e sintam a presença de Deus naquela Sua imponente obra.

Se hoje ela é compartilhada por brasileiros e argentinos, poderia ser apenas destes últimos, pois foi o espanhol Álvar Nuñez Cabez de Vaca quem, em 1542, a descobriu. O primeiro brasileiro apareceu por lá, para morar, somente em 1881.

Atualmente, a convivência com os “hermanos” é tão harmoniosa, que sequer o futebol consegue perturbá-la. Mas, por falar em Deus, jesuítas e harmonia, vou relatar um fato que o Rafael me confidenciou. Há duas empresas, uma brasileira e outra argentina, que proporcionam um emocionante passeio de bote inflável que leva os turistas até debaixo das cataratas. Rafael topou a parada.

Durante o passeio, quando os barcos se cruzavam, independente da nacionalidade, os turistas saudavam-se alegremente (turistas estão sempre alegres). Pois bem. Rafael observou uma faixa num bote argentino que se aproximava. Só conseguiu ler quando ele estava perto: “Habemus Papam”. Euforia plenamente compreensível. Porém, mais do que argentino, Francisco I é jesuíta, como aqueles que aqui viveram nos anos 1600. Agora, ao que parece, eles estão de volta. Que seja bem-vindo Papa Francisco! Afinal, na Tríplice Fronteira todos são “hermanos”.

Fonte: www.bonat.com.br