*Hamilton Bonat
Tome aqui a sua máscara e o seu foguete. Se fizer um bom trabalho, volte para receber R$150,00.
O “bom trabalho” seria infiltrar-se, desde junho de 2013, entre milhões de jovens indignados com a roubalheira. Fingindo ser um deles, a missão seria somente cuspir na polícia, lançar contra ela pedras e foguetes, e claro, contar com a boa-vontade da imprensa, que registraria apenas a reação policial, nunca a sua causa.
– Invada palácios, câmaras de deputados e vereadores. Quem tentar lhe impedir será tratado como antidemocrático. Aponte sempre na direção dos policiais. Se um morrer, tudo bem. Missão cumprida! Policial não tem pai nem mãe, muito menos esposa e filhos. Mande brasa!
Mal sabia, aquele que estava recebendo tais instruções, que era ele o principal alvo. Qualquer mascarado morto seria um troféu, o cadáver perfeito, ao custo de reles R$ 150,00, migalha, se comparada aos milhões que os partidos recebem anualmente do tal fundo partidário, logicamente pago pelo contribuinte.
O que a imprensa realmente buscava, desde junho de 2013, era o cadáver de um black bloc. Seria o grande furo: o “presunto” de um manifestante, como todos, carinhosamente (ou seria covardemente?), os tratavam.
Mas o destino (eita destino!), acabaria transformando o caçador em caça. A vítima fatal seria um repórter, não um policial, muito menos o preferido de todos: um black bloc.
Assim que foram ao ar as primeiras imagens de Santiago Andrade sendo atingido, a rede Globo apressou-se em culpar a PM. Mais do que injusta, a notícia revelava de que lado a emissora estava naquela luta entre baderneiros e sociedade. Enquanto os primeiros (os black blocs) representavam a democracia, a liberdade e a inocência juvenil, os segundos (a polícia) tinham sabor de truculência, de despreparo e de tirania.
As ações criminosas e antidemocráticas, como bloqueio de ruas e avenidas, depredações e saques de lojas comerciais (grandes e pequenas), de agências bancárias e de bens públicos, ataques com pedras, barras de ferro, foguetes e coquetéis molotov, sempre foram tratadas com muita benevolência.
Confesso ter sido a primeira vez que vi William Bonner gaguejar e tropeçar nas palavras. Era preciso justificar o injustificável: que o assassino não tinha sido da PM, mas sim daqueles tratados quase como beatos, manifestantes ou ativistas, jamais como baderneiros e terroristas.
Representantes da imprensa apressaram-se em acorrer ao Ministro da Justiça, o mesmo que recebera, seis meses antes, proposta do Secretário de Segurança do Rio no sentido de que a Lei fosse mais rígida com os vândalos que estavam infernizando a vida dos cidadãos das nossas duas maiores cidades.
Mas como aqueles Estados não são (ainda) governados pelo partido que comanda o país, por acaso o mesmo do senhor ministro, a proposta simplesmente foi engavetada.
Em suma, ao que parece, os líderes da imprensa pediram para a raposa cuidar dos ovos. Ou, em termos militares, confiaram demasiadamente no “fogo amigo”. Creio ter sido bem ele, o fogo amigo do senhor ministro, que sonhava com a morte de um black bloc, que, infelizmente, acabou deixando viúva a esposa do cinegrafista Santiago Andrade.
Hamilton Bonat pertence ao quadro de Associados Efetivos da Academia de Letras José de Alencar
Fonte: http://www.bonat.com.br/